quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Quer um pedaço?


A expectativa consumia a todos, afinal era uma experiência interessante visitar uma escola municipal no turno noturno para apresentar a campanha contra o extermínio de jovens. Queríamos envolver toda a comunidade escolar. Para isso, preparamos dinâmicas, estudamos dados, criamos diversas situações para melhor expor as idéias e efetivar o objetivo diante das possíveis dificuldades que enfrentaríamos.
Chegamos!
Silêncio incômodo. Teria aula nesta noite? Talvez seja cedo, talvez o transporte escolar não tenha chegado, talvez seja normal, estranhamente normal.
Entramos...
-Olá diretor, nós somos...
-Ah, sei, me disseram, a escola é de vocês!
O poder em mãos, a cabeça cheia de perguntas e um sentimento: apreensão.
Nos corredores, impressões nos flecham e retornam. Direcionamo-nos nas paredes sujas, nas portas quebradas, na rampa inutilizada, e somos atingidos por olhares que nos associam a uma comida nunca antes experimentada: O que é isso? Será que é bom? Engorda?
A angústia me domina.
A rotina é quebrada.
Apresentamo-nos em meio a carência estrutural e humana estabeleciada e reproduzida pelos mesmos "donos" de não sei o quê. Quem deveria libertar aparenta cristalizado nos pensamentos estáticos e imutáveis.
Então abrimos a boca. Falamos, tentamos falar, envolvemos, tentamos envolver. Tentativas traduzidas em esperança para aqueles que conseguimos manter um diálogo, algo muito válido diante de todo contexto. Saímos de nossas bolhas individuais e entramos em outra totalmente descalços, sentindo o chão que pisamos. Chão que insistimos em mascarar e banalizar sua aspereza.
Ao toque da música todos se tornaram um, em sentimento, em força, em desejos e em incômodo. Sim, em incômodo para os que dormem no pseudo ofício de governar, dirigir, coordenar e ensinar. Seja numa escala macro ou micro, a existência de culpados é pouco relevante diante dos papeis que estão aí, prontos para serem exercidos. Seria o vício da crítica pela crítica?
- Então é isso pessoal, obrigado pela atenção e até a próxima.
A tão necessária merenda é servida, voltamos ao cotidiano conhecido. Infelizmente nesta noite não fomos o prato principal. A despedida calorosa me deixa indignado, estranho não acha? Sou apenas mais um estranho nesse mundo de normalidades "deglutíveis".

(José Avelino)

sábado, 14 de agosto de 2010

Desatando


Em meados
entre meios
entretanto
sem rodeios
quebro o vaso
antes cheio
de consciência.

Minha ciência
de aparência
derramada
na vivência
do vaso
acaso?

Antes fosse
antes doce.

Infiltra em chão
corroe então
e enche em vão
outro vaso
já marcado
pela sã...
imagem.
Consciente e desatina.

(José Avelino)